terça-feira, 7 de setembro de 2010

Conversa com... Naide Gomes

“É quase obrigatório ganhar uma medalha, mas nem sempre é possível…”

Naide Gomes, nasceu em São Tomé mas com apenas dez anos chegou a Portugal. Não trouxe consigo na bagagem o atletismo, no entanto esta modalidade desde cedo fez parte do seu dia-a-dia. Actualmente raramente fica fora do pódio. Reconhece o seu valor e os factos falam por si. Está entre as melhores atletas do mundo no salto em comprimento.

1. É natural de São Tomé. Como chegou a Portugal?
Naide Gomes: Cheguei a Portugal com apenas 10 anos, vim ter com a minha mãe que já se encontrava a viver em Portugal. Viemos (eu e a minha mana) em busca de melhores condições de vida e de estudo. Desde 1999 que trabalho com o Prof. Abreu Matos e a sua visão motivou-me a pedir a naturalização, uma vez que teria mais oportunidades para entrar em competições de alto nível. O processo foi longo e só aos 22 anos me naturalizei portuguesa.

2. O atletismo foi um desporto que já trouxe consigo na bagagem?
Naide Gomes: Não, quando cheguei a Portugal não conhecia nada de atletismo, mas cedo o atletismo tornou-se o centro da minha vida. Iniciei o atletismo no Desporto escolar quando tinha 13 anos, por incentivo do meu professor Mota Capitão, é a ele que agradeço por ter-me aberto o coração para o atletismo.

3. Como se deu o gosto pela modalidade?
Naide Gomes: Descobri um talento inato para o atletismo aos 13 anos. Vencia todas as provas escolares e o meu professor incentivou-me a apostar nesta modalidade. Eu competia apenas por gosto e não imaginava tornar-me atleta profissional. Até que decidi dedicar-me mais a sério ao atletismo e comecei a colher os frutos do meu empenho.

4. E porque o salto em comprimento?
Naide Gomes: Comecei nas Provas Combinadas (pentatlo e heptatlo) e alcancei uma medalha de prata europeia e uma medalha de ouro mundial. Embora a minha versatilidade fosse um ponto forte, as lesões que advinham de praticar diferentes disciplinas falaram mais alto. Com a ajuda do meu treinador, percebi que tinha de especializar-me para continuar a competir e o considerámos que o salto em comprimento era a melhor aposta.

5. Passou por vários clubes, até que chegou ao emblema leonino. O que esteve na base dessa integração?
Naide Gomes: Antes de integrar a equipa do SCP estive no JOMA durante algum tempo. A minha vontade de crescer profissionalmente e o meu talento acabaram por desencadear um convite para representar o Sporting, o qual tive muito orgulho em aceitar.

6. O que significa para si pertencer ao clube de Alvalade?
Naide Gomes: Tenho uma relação muito boa com o SCP e especialmente com o meu treinador. É para mim uma honra continuar no clube que me desafiou e acolheu desde 1999.

7. Quem são os responsáveis pelo seu sucesso?
Naide Gomes: Para além da minha dedicação, empenho e força, julgo que o meu sucesso não seria possível sem o Prof. Abreu Matos, o meu treinador, a minha família, os meus amigos que tanto me incentivam e o Sporting Clube de Portugal que sempre me apoiou financeiramente para que pudesse dedicar-me exclusivamente ao atletismo.

8. Qual é o seu primeiro pensamento quando entra num estádio?
Naide Gomes: Sempre que ponho o pé numa pista deixo para trás qualquer insegurança ou nervosismo. Estou ali para dar o meu melhor e vencer.

9. Rapidamente conheceu as luzes da ribalta. Como lida com o mediatismo à sua volta? Autógrafos, fotografias…
Naide Gomes: Sinto-me muito acarinhada pelos portugueses. Oiço muitas vezes palavras de incentivo e de agradecimento, o que me deixa ainda mais motivada para superar com distinção todos os desafios que me apresentarem.

10. Já participou em muitas e variadas provas mas vamos falar numa em especial. Como caracteriza a final dos jogos olímpicos em Pequim? Um drama? Porquê?
Naide Gomes: Depois de tanto esforço, empenho e sofrimento para chegar até lá, o que aconteceu marcou-me muito. Foi difícil aceitar que estava afastada dos Jogos Olímpicos. No entanto, fiquei também mais forte e motivada psicologicamente porque sei que sou uma grande atleta e, como tal, nunca baixo os braços.

11. Alguma vez penso em desistir da competição?
Naide Gomes: Não. Mesmo quando tenho muitas dores isso nunca me passa pela cabeça. Porque a paixão por aquilo que faço é tão grande que a palavra desistir nunca fez e fará parte do meu vocabulário. Sei que nos próximos anos irei afastar-me das pistas, é o curso natural das coisas, mas não queria deixá-las sem ter uma sucessora.

12. Mais recentemente no passado dia 2 de Agosto chegou a Portugal vinda da participação nos europeus de Barcelona. Foi a melhor dos 4 portugueses, trazendo para casa a única medalha de prata. Aspirava a medalha de ouro que perdeu para a letã Radevica?
Naide Gomes: Naturalmente que quando fui aos Europeus de Barcelona, o intuito era regressar a Portugal com o ouro. Mas nem sempre é possível. Dei o meu melhor, por isso estou satisfeita.

13. Como é perder num desempate? É um sabor ainda mais amargo?
Naide Gomes: Quando estamos na alta competição temos de estar preparadas para estes dissabores.

14. Lamenta a má sorte em relação ao ouro que ficou por ganhar na competição?
Naide Gomes: É claro que o factor sorte também entra para a equação e quando ela está do nosso lado conseguimos ir um pouco mais longe. Mas o que mais me interessa é continuar a luta para me superar.

15. Há poucos dias atrás esteve em Estocolmo para tentar ganhar o diamantezinho. Tal não aconteceu…
Naide Gomes: A participação em Estocolmo não correu como gostaria, não consegui encontrar-me durante toda a competição, talvez por estar um pouco cansada e o joelho não se encontrar nas melhores condições. No entanto, já fiz mais 2 competições, que também não correram como gostaria, e não consegui conquistar o tão precioso diamante. Fiquei em 3º lugar na Diamond League… mas estou feliz com a época que fiz e que ainda não terminou…

16. Em qualquer competição, como é ver-se fora do pódio?
Naide Gomes: Não é habitual ficar fora do pódio. Reconheço o meu valor e sei que estou entre as melhores atletas do mundo no salto em comprimento. É quase obrigatório ganhar uma medalha, mas, lá está, nem sempre é possível…

17. Qual a sensação de se ganhar uma medalha?
Naide Gomes: Uma medalha é a recompensa por todo o trabalho árduo de preparação, de luta para contornar as lesões e as dores. Subir ao pódio é altamente gratificante; é um orgulho.

18. Há alturas em que sente duplo sentimento, ou seja existe alturas em que se sente feliz por receber medalhas e por outro lado por essa medalha não ser a de ouro?
Naide Gomes: Quando salto, o objectivo é vencer. Quando isso não acontece, temos de transformar o dissabor em força e motivação para continuar a treinar para uma superação constante.

19. Já contabiliza dez medalhas em poderosíssimas competições internacionais. Como se sente perante tal facto?
Naide Gomes: Sinto que valeu a pena todo o esforço e dedicação, tanto meu como o do meu treinador. Que é uma honra ter talento para estar entre as melhores do mundo e que consigo levar o nome de Portugal mais longe.

20. A medalha dos jogos olímpicos e de Mundias ao ar livre, são essas as que mais aguarda?
Naide Gomes: Sim, faltam essas duas. Vou continuar a trabalhar e a lutar por elas com todas as forças que tenho e concretizar o nosso sonho (meu e do meu treinador).



sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Conversa com... António Tadeia

António Tadeia é jornalista, comentador de futebol e cronista. Numa entrevista directa, sem qualquer tipo de rodeios caracterizou a sua actividade e fez um diagnostico ao futebol português da actualidade.

1.É jornalista, comentador de futebol e cronista no jornal O Jogo assim como no Diário de Notícias. O que o fez enveredar pela área da Comunicação Social?
António Tadeia: Sou jornalista em primeiro lugar, director-adjunto de “O Jogo” e comentador da RTP depois. Vim para a comunicação social porque desde cedo quis comunicar com os outros, partilhar conhecimentos e, porque não, influenciar com a minha opinião o que pensam os outros. Há algo de evangelização na tarefa.

2.Há alguma paixão pelo futebol que o fez trabalhar para um mundo entre quatro linhas?
António Tadeia: Absolutamente. Vivo a ver, a ler e a escrever sobre futebol desde que me lembro.


3. António Tadeia para além de cronista é também director-adjunto no jornal O Jogo. Exerce mais alguma actividade no jornal e fora do mesmo?

António Tadeia: É ao contrário. A minha actividade principal é a direcção da redacção de Lisboa de O Jogo. A crónica e a opinião são inerentes ao cargo. Fora do jornal, em termos profissionais, faço comentários de futebol na RTP.


4.
O que o fez tornar um cronista assíduo no jornal O Jogo?

António Tadeia: Em 2006 tomei a decisão de deixar a chefia de redacção do “Correio da Manhã”, onde estava na sequência do meu trabalho no Record e na Record Dez, para me tornar “free-lancer”. Queria escrever mais e mandar menos. Foi bom e durou até 2009, quando de O Jogo, onde estava como colunista, me convenceram a aceitar um lugar na direcção.


5. O que pretende com o seu lado critico?

António Tadeia: Todos os opinadores querem mudar a percepção do Mundo que os outros têm. Quem tem uma opinião acha que sabe o melhor caminho e tenta convencer os outros disso. E nunca fui um opinador dos que acham que está tudo bem, que se colam ao sucesso para ficarem confortáveis com toda a gente.


6. Qual a mensagem que pretende transmitir aos seus leitores?

António Tadeia: Não há UMA mensagem. Há a tentativa de ser sério, rigoroso e justo, porque disso não abdico nunca.


7.“Poeta do quotidiano, como alguém chamou ao cronista dos nossos dias, apresenta um discurso que se move entre a reportagem e a literatura, entre o oral e o literário, entre a narração impessoal dos acontecimentos e a força da imaginação. Diálogo e monólogo; diálogo com o leitor, monólogo com o sujeito da enunciação. A subjectividade percorre todo o discurso”. Sente-se um artista?

António Tadeia: Não. Caramba!


8. A crónica é uma forma de arte?

António Tadeia: A crónica pode ser literatura e, portanto, arte. Mas eu faço menos crónica e mais opinião e análise.


9. Na sua opinião qual a importância da crónica na sociedade portuguesa?

António Tadeia: Temos excelentes cronistas em todas as áreas da sociedade, mas que infelizmente não são tão lidos como deviam.


10. É algo que enriqueci o jornal, ou a revista? Porque razão?

António Tadeia: A crónica enriquece porque nos apresenta as coisas de um ponto de vista diferente, muitas vezes pessoal, mas com ligação ao geral. E quando alguém partilha connosco as suas experiências está a tornar-nos mais ricos.


11.
No blog “Voando à deriva” de João Martinho ele refere num artigo denominado “antónio tadeia, paul-céptico” que o António é “ conhecido pelo seu prolífico trabalho na área do comportamento animal e, menos um bocado, pelo trabalho como comentador de futebol”. Tem alguma explicação para tal afirmação?

António Tadeia: Não. E creio que o autor da frase também não a terá.

12.
Há quem o caracterize também como o “comentador sem vergonha”. É um comentário que o enaltece ou entristece? Porquê?

António Tadeia: Entristece-me. E só não me envergonha (sim, tenho vergonha) porque não sei quem me caracteriza assim.

13.
Em muitas análises que são feitas os comentadores perderam, tal como os árbitros, a vergonha?

António Tadeia: Sou incapaz de reconhecer a unicidade da classe dos comentadores. Há os mais envergonhados e os menos envergonhados.


14. O mundo do comentário já lhe trouxe inimigos?

António Tadeia: Aparentemente, a julgar pelo que me pergunta, parece que sim.


15.
Como se lida com olhares invejosos à nossa volta?

António Tadeia: Nunca dei por eles.


16. Há competitividade no mundo da crónica? Sente ou alguma vez já sentiu isso?

António Tadeia: Haverá certamente. Mas nunca a senti, porque a crónica nunca foi a minha actividade principal. Desde 1989 que sou jornalista de redacção.


17.
No seu olhai mais crítico, que diagnostico faz do futebol português?

António Tadeia: Os grandes problemas do futebol português são a inexistência de mercado interno e a injustiça na distribuição da receita. Os grandes recebem muito mais do que os pequenos e assim não se estimula a competitividade. Como a globalização leva a que os grandes se apetrechem cada vez mais no estrangeiro (e não nos pequenos), o dinheiro não circula. O resultado é a diminuição de qualidade da competição interna.


18. Se pudesse, que medidas tomaria para as consegui um futebol espectáculo a um nível mas elevado?

António Tadeia: Está tudo no dinheiro. Melhor distribuição da receita e responsabilização de quem manda.


19. É um crítico em torno do que se passa a sua volta?
António Tadeia: Sempre. A crítica é indispensável ao progresso.

03.09.2010