“Para mim o futebol é 10% talento e 90%trabalho”
Vítor Bruno é um defesa esquerdo completíssimo, detentor de um enorme potencial, aliado a uma maturidade invulgar para um jogador tão jovem.
É deste modo que no futebol há também lugar para aqueles que dotados de características, como a regularidade, a entrega, a raça e a dedicação, se destacam e acabarão mesmo por superar as suas tão desejadas pretensões. Para pessoas com qualidades assim há sempre lugar e fôlego para mais uma distinta recompensa.
E eis que a dele irá chegar. Só lhe falta visibilidade em dose q.b.
Durante a nossa conversa a emoção estava à flor da pele, nomeadamente quando recordou com nostalgia os tempos da formação. Conseguiu transpor sempre para palavras a sua garra e convicção quando fala com orgulho da camisola que se dispõe a vestir.
1.Começaste desde cedo a conhecer o gosto pelo futebol. Como foram os teus primeiros tempos de chuteiras calçadas e equipamento vestido?
Vítor: Os meus primeiros tempos no futebol federado foram no Famalicão quando tinha onze anos. Foram momentos essencialmente felizes e de grande satisfação, onde comecei a demonstrar já algum potencial, embora nessa idade ainda seja um pouco precoce para avaliar alguma coisa em termos futuros.
2.Já percebias ou alguém te dizia que virias a ter enorme potencial?
Vítor: Como disse anteriormente, penso que é extremamente precoce avaliar-se alguém aos doze, treze anos. É uma idade na qual não se sabe os caminhos que se poderá seguir. E em termos de uma vida profissional, mais ao nível do futebol é prematuro, não podemos avaliar nada desde muito cedo. Inclusive, outras pessoas não ligadas ao Famalicão elogiavam-me e enalteciam-me por aquilo que fazia.
3.Nunca sonhaste em demasia?
Vitor: Eu tive sempre o meu objectivo muito bem definido. Sempre quis ser jogador de futebol, isso sempre foi algo que eu sabia e queria mesmo conseguir fazer. Desde muito cedo me mentalizei e os meus pais sempre se mentalizaram que era algo que eu queria seguir,
4.E quando alguém se apercebe do nosso talento e nós faz um convite de cortar a respiração? Presumo que tal aconteceu quando foste chamado a brilhar de dragão ao peito.
Vítor: Esse convite nasceu num torneio de Lisboa a nível nacional de inter-assoçiações, no qual representava a associação de Braga. Fomos campeões e como é óbvio eu, tal como mais alguns colegas de equipa destacamo-nos. Saímos três ou quatro para clubes de renome a nível nacional. E não sei se foi essa a altura em que realmente senti que poderia ter potencial e talento. Como referi anteriormente essas avaliações são muito precipitadas e para mim o futebol é 10% talento e 90%trabalho,
5.Como classificas e caracterizas todo o tempo de formação, nomeadamente o tempo passado no FCPorto?
Vítor: Acima de tudo, embora passando por momentos positivos e outros menos bons, foi uma aprendizagem que me servirá para a vida e que me dará bases para no futuro poder singrar no futebol. O FCPorto é uma escola.
6.Momentos que marcam existem alguns, uns pela positiva e outros mais pela negativa. Algum para contar?
Vítor: O momento mais negativo foi essencialmente o meu último ano de juniores. Lutava, trabalha e treinava todos os dias com a mesma personalidade e postura para conseguir ter a minha oportunidade. E afinal, não me deram oportunidade para poder brilhar e singrar. Tal como disse, o último ano de juniores é o mais importante na formação. Não interessa o que fizeste até aí, a última imagem é que fica. Guardo alguma mágoa com isso, mas agora é outra vida. Estou noutra fase e o que mais me motivou e me deixou de consciência tranquila foi no final quando me informaram que não iam ficar ligados contratualmente comigo e me felicitaram pela entrega, por não ter criado mau ambiente no balneário. Quando fui chamado a intervir, interví bem e ajudei o porto alcançar um objectivo, mais concretamente a Liga Intercalar. E como anteriormente referi saí de consciência tranquila.
7. Como foi a tua relação com a equipa técnica, com a direcção e a coordenação? Algum treinador que te marcou?
Vítor: Quando jogava e as coisas corriam bem, as pessoas vinham ter comigo, falavam abertamente comigo e faziam-se todos de muito amigos, digamos assim. Inclusive o treinador tinha conversas mais especificas e mais pessoais sobre o plantel, sobre o rendimento do mesmo e sobre escolhas que fazia, Nos meus momentos mais altos as pessoas mostravam-se com outro tipo de atitude, bem mais acessíveis, E depois fui um pouco abandonado na parte final e ai demonstraram as verdadeiras pessoas que eram,
Quanto aos treinadores que me marcaram, refiro o nome de Vítor Pereira e Rui Gomes que foram aqueles que deixaram mais saudade.
8.E como foi lidar com a personalidade, exigências e trabalho do treinador holandês?
Vítor: Acima de tudo aprendi bastante com ele, numa perspectiva não tanto pessoal porque me “prejudicou”. Mas entendo que cada um tem as suas opções. Quanto ao trabalho técnico gostei, tinha métodos diferentes de outros treinadores portugueses e com essa diversidade de métodos aprendemos e evoluímos.
9.Durante o teu último ano na formação azul e branca, a classificação final não foi a desejada para o clube que representavas. O que faltou nessas época?
Vítor: Mais entreajuda no grupo. Havia culturas, nacionalidades e formas de estar completamente diferentes porque tínhamos jogadores estrangeiros. Não só focado num país mas em várias zonas mundiais. Talvez tenha faltado mais espírito de grupo, aquela vontade de sermos essencialmente amigos dentro de balneário.
10. Sentes então que ao excesso de jogadores estrangeiros afectou a participação da equipa?
Vítor: Afectou desde inicio o bom rendimento do balneário. O jogador quando vem, vem com protagonismo diferente dos outros e com oportunidade diferentes das que são dadas aos jogadores portugueses. Existe para com eles uma protecção maior e isso cria um mau estar no plantel. Mas atenção, não sou contra a vinda de jogadores estrangeiros para o nosso país porque defendo a ideia que a formação é uma preparação para a passagem sénior, no entanto para tudo existe um limite. Há que dar valor e oportunidades para que os jogadores portugueses tenham uma formação/evolução equilibrada.
11.E o titulo na liga Intercalar que deste ao Porto? Foi um momento que te marcou?
Vítor: Foi como é óbvio um momento que me marcou a mim e a toda a equipa. A mim em especial porque nesse jogo, contra o Paços de Ferreira, marquei o golo do empate o que permitiu à minha equipa chegar até às grandes penalidades. No entanto, esse momento pelas gentes do FCPorto foi desvalorizado e relativizado.
12.Os anos passam e novos desafios surgem. Como é então encarada a responsabilidade e o desafio de pertencer ao plantel sénior?
Vítor: É muito diferente jogar a nível sénior. No escalão superior lidas com idades diferentes, formas de estar na vida diferentes, jogadores casados e com filhos, que poderiam muitas vezes serem nossos pais. Por tudo isto, é importante criar uma boa relação dentro do balneário.
13.Era algo que ao longo dos anos vinha sendo ansiado cada vez mais?
Vítor: Nunca pensei muito nisso, só mesmo na fase final do campeonato de juniores me comecei a sentir um pouco abandonado. Nunca pensei ser tão difícil a integração num clube.
14.Para além de cresceres em vários aspectos ao integrares um plantel superior, também passaste e sentiste algumas mudanças ao ingressares num clube da III Divisão Nacional, refiro–me ao teu clube no primeiro ano de sénior (CDCandal). Muitas mudanças encontradas, a nível de instalações, infoestruturas, massa associativa, direcção, entre outros…?
Vítor: Sem dúvida. Nós estávamos habituados a tudo ao bom e do melhor, tudo à grande e de repetente vemo-nos no lado oposto. São clubes totalmente diferentes, estruturas também e um nível de vida também diferente mas o ser humano é isto, tem de se adaptar às circunstâncias da vida. E eu tinha de me adaptar rapidamente ao meio em que estava inserido para poder evoluir de forma natural e não estar sempre a pensar: eu fui jogador do Porto, isso podia-me prejudicar no futuro.
15.Sei que para além da formação no Famalicão e no FCPorto, passaste também no primeiro ano de juniores pelo Candal. Actualmente o Candal detêm sobre ti direitos de formação, o que faz por necessidades financeiras, penso eu, e exige por ti aos outros clubes profissionais uma verba exorbitante, até atingires os 23 anos. O que tens a dizer sobre isto?
Vítor: É um tema extremamente complexo porque os direitos de formação podem prejudicar um jovem em termos de afirmação e em termos de subir na carreira. E é inevitável que não prejudiquem, porque neste momento com a crise que atravessamos nenhum clube está disposto a pagar valores altos por jovens em inicio de carreira e que no futuro não sabem o que poderão vir a ser. É uma forma de sobrevivência dos clubes pequenos e ter um extra é muito importante para o futuro financeiro desses mesmos clubes. No entanto, são oportunidades que se perdem devido à intransigência de negociação.
16. Pretendes manter as boas relações com o Candal?
Vítor: Qualquer jogador tem de manter boas relações com o seu passado. Foram momentos muito felizes, os vividos no Candal, fui lá internacional nos juniores sub18 e tenho obrigatoriamente de manter boas relações, isso faz parte de mim. Vamos ver se conseguimos chegar a algum acordo no futuro.
17.Esta época, 2010/2011, representarás o GD Ribeirão da II Divisão. É um clube num patamar mais elevado, com outro tipo de projecção. No entanto, continua a ser um clube não profissional. Que importância para ti a todos os níveis, acreditas que terá a temporada que se avizinha?
Vítor: O Ribeirão tem uma estrutura jovem, um clube que me permitirá certamente continuar a evoluir, pois tem mais projecção. Está num patamar superior, numa divisão superior, com um plantel jovem o que por si só é bom, pois em termos de adaptação será com certeza mais fácil. Portanto, penso que estão aqui os ingredientes para que seja uma temporada positiva e no plano pessoal será uma contínua evolução que tenho de ter.
18. E que certezas pode dar aos adeptos do Ribeirão no que diz respeito à tua atitude e entrega ao vestir a camisola?
Vítor: Entrega sempre em tudo que faço. Seja em treino, em jogos, seja no que quer que for. Entrarei sempre com o máximo de empenho e de atitude para dignificar a camisola, essa é a maior certeza que poderei dar aos ribeirenses.
19.Com certeza que já terás noção do que será ter responsabilidade, pois já representaste a nossa Selecção Nacional. Que escalões já representaste na selecção? Quantas internalizações tens?
Vítor: Tenho uma internacionalização. Representei os sub 18 mas treinei em escalões inferiores, como os sub 16, mas não joguei nenhum jogo. Houve uma fase nesse escalão em que fui chamado mas o FCPorto não me deixou porque havia divergências entre a selecção e o FCPorto na altura. Acabei por não ter essa oportunidade.
20.O que se sente quando se ouve o hino Nacional a soar no nosso ouvido e sobretudo no nosso coração?
Vítor: É uma alegria imensa. É extraordinário estar dentro do campo e olhar para a bancada e ver todas as pessoas a cantarem o hino. Mais emocionante, é olhar e ver os nossos pais. É uma sensação indescritível.
21.Num balneário repleto de gente muito diferente, como se lida com pessoas com personalidades muito diferentes e muitas vezes, muito atenuadas?
Vítor: Tem de haver esse tal espírito de grupo, a compreensão que somos todos diferentes mas que estamos a lutar em prol de uma causa. Dentro de um balneário temos de nos comportar como se fossemos uma família, pois o balneário é cada vez mais importante para o sucesso da equipa.
22.Ao longo da vida, vamos aprendendo muita coisa. Há quem nos dê lemas, perspectivas e frases que nos marcam para sempre. Há alguma que o tenha marcado em especial e que lhe dê força quando mais necessita dela?
Vítor: O lema ou frase que me guia sempre é bastante simples: serei aquilo que sempre ambicionarei ser!
23. A tua integração e esse apoio que tens e tiveste no mundo do futebol deve-se alguém em especial?
Vítor: Os meus pais são o alicerce e o suporte maior que posso ter neste momento. São extremamente importantes para mim. Acompanham desde sempre a minha contínua evolução. Ajudam-me nos momentos negativos que tenho, nomeadamente em lesões que são momentos em que não falamos com ninguém e no qual as pessoas mais próximas levam com o nosso mau humor. É nessas pessoas que neste momento deposito enorme confiança e um grande sentido de valorização.
24.Ser jogador de futebol exige sacrifícios…Aos 20 anos ainda mais… Em que medida tiveste de adaptar a tua vida? Pertencer a uma equipa sénior é sinónimo de deixar coisas por viver?
Vítor: Podemos viver tudo mas no seu tempo. Para podermos seguir algo temos de ter consciência que temos de abdicar de algumas coisas. Eu não tenho problemas de abdicar do que quer que seja.
25.Esses sacrifícios futuramente vão ser retribuídos? Há essa esperança?
Vítor: Se não tivesse esperança não havia nenhum fundamento andar neste meio.
26.Neste momento o que ocupa mais destaque na tua vida?
Vítor: O futebol. Sem o futebol não conseguia viver nem ter um sorriso diário.
27.E agora, o que pensar para o futuro?
Vítor: O futuro neste momento é o Ribeirão, onde se concentram as minhas energias.
28.A ilusão é um dos perigos do futebol? Sentiste e ainda o sentes?
Vítor: De facto, a ilusão é um dos perigos do futebol mas no meu caso tento ter sempre os pés bem assentes na terra e não me iludir momentaneamente por algum tipo de sucesso que vá acontecendo.
PARABENS ANA POR ESTA ENTREVISTA. TIVE O PRAZER DE PRIVAR COM ESTE SER HUMANO E É UM SER EXTRAORDINÁRIO. UMA VISIBILIDADE MAIS ACRESCIDA É MESMO O QUE PRECISA. DE RESTO TEM TUDO
ResponderEliminarALGUEM QUE O TREINOU MAS QUE PREFERE MANTER O ANONIMATO
COM OS MELHORES CUMPRIMENTOS
Vitor Bruno ja mostrou o que valia no Ribeirão GRANDE JOGADOR... !!!!!!!
ResponderEliminarbom trabalho por parte da autora do blog.... : )