quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Conversa com... Bruno Magalhães

Bruno Magalhães é campeão Nacional de Rally. Actualmente, defende as cores da Peugeot Total e faz dupla com Carlos Magalhães. Este ano, no mês de Julho venceu o Rally Açores. Foi uma estreia a ganhar no Internacional Rally Challenge e para ele “foi a vitória mais importante da minha carreira. Realmente uma prova para mais tarde recordar, pelo resultado, pela emoção e pelo ritmo imposto”.

1. Como foi a sua entrada para o automobilismo?
Bruno Magalhães: O meu pai ja fazia ralis e eu sempre tive essa paixão. Quando tirei a carta o meu sonho era correr e como havia nessa altura uma estrutura para o meu pai, acabei por ter a oportunidade de entrar neste mundo.

2. Conte-nos um pouco da sua trajetória nos rallys.
Bruno Magalhães: Comecei a correr de uma forma amadora mas logo com carros potentes, pois acabei por ficar com os carros do meu pai, e fiz ralis assim desde 1999 até 2002. Nessa altura liguei-me à Peugeot e em 2004 venci o troféu que tinha como prémio correr pela equipa oficial no ano seguinte. A partir daí corro nesta equipa pela qual venci 3 titulos de Campeão Nacional

3. Qual a prova que lhe fica mais na memoria? E qual aquela que mais quer esquecer?
Bruno Magalhães: Na memória a vitória deste ano nos Açores, pois foi a minha primeira vitória no IRC. Para esquecer o Rally da Madeira pela desilusão que me causou.

4. Faz dupla com Carlos Magalhães e defende as cores da Peugeot total. Como se deu a sua integração na marca de automóveis?
Bruno Magalhães: Em 2002 recebi um convite para desenvolver o futuro carro do troféu e aceitei esse desafio.

5. A dupla que faz com Carlos Magalhães. Como a caracteriza e define?
Bruno Magalhães: O Carlos é um excelente navegador, com muitos anos de competição e um grande amigo.

6. Qualquer prova de rally acaba por ser proveitosa? Porque razão?
Bruno Magalhães: Porque seja qual for o resultado aprendemos sempre alguma coisa de novo.

7. E quando a felicidade não está do nosso lado?
Bruno Magalhães: A mesma razão, por vezes nessas alturas aprendemos mais do que quando as coisas correm bem.

8. Que sentimento persiste em si quando denota problemas mecânicos no automóvel?
Bruno Magalhães: É sempre um pouco frustrante, mas com alguns anos de corridas já sei que por vezes mesmo com o máximo cuidado os problemas acontecem. Às vezes o material novo também avaria e quando assim é não há nada a fazer.

9. No passado mês de Julho, venceu o Rally Açores. Foi uma estreia a ganhar no Internacional Rally Challenge. Como viveu o momento?
Bruno Magalhães: Com muita satisfação. Foi a vitória mais importante da carreira. É um rally de cortar a respiração, apenas decidido no último troço. Realmente uma prova para mais tarde recordar, pelo resultado, pela emoção e pelo ritmo imposto.

10. Venceu a prova açoriana com 1.00,1 minutos de vantagem sobre o britânico Kris Meek (segundo classificado) e 1.20 minutos à frente do finlandês Juho Hanninen que terminou na terceira posição. Um minuto e até segundos são muitas vezes decisivo nas suas provas. Como lida com os tempos?
Bruno Magalhães: Sim, mas o rally só se decidiu no último troço. Lido com naturalidade, mas com mais satisfação quando o tempo é a meu favor.

11. Luta a todos os instantes por melhores tempos? É algo que atormenta o seu pensamento?
Bruno Magalhães: Claro que não, as corridas são isso mesmo.

12. Presumo que quando alcança bons resultados chovem-lhe telefones e mensagens de felicitação. E quando o contrário se sucede?
Bruno Magalhães: É verdade que se recebem mais quando se ganha, mas os verdadeiros amigos ligam sempre, corra bem ou mal.

13. O rally Vinho da Madeira é o seu preferido. Pode-nos explicar porque?
Bruno Magalhães: Foi o primeiro rally que fiz do nacional e fiquei logo apaixonado. Desisti no último troço com um problema mecânico e foi muito inglório, porém um rally que não esquecerei. Adoro o ambiente à volta do rally e a força que as pessoas me dão, bem como as especiais que são lindissimas. Sem duvida o meu preferido, embora não tenha muita sorte neste rally.

14. “Esta é uma prova que conheço bem, e sei que é extremamente técnica e que exige dos pilotos o seu máximo desde o primeiro metro de estrada. Não há lugar para distracções e a melhor estratégia é o ataque desde o primeiro momento”. Antes desta prova, em Agosto, foi assim que definiu esse rally. No entanto, não o consegui ganhar. O que faltou?
Bruno Magalhães: Faltou tudo menos ambição. O rally começou mal com um furo, pois toquei em qualquer coisa com a parte lateral do pneu, e logo aí perdi as chances de vencer. Estava confiante depois da vitória nos Açores, sentia que podia ganhar e o carro estava bom, mas infelizmente ainda não foi possível desta vez.

15. Por infortúnio teve de abandonar a prova devido a um depois de um violento despiste na terceira classificativa. O que aconteceu?
No final da segunda especial do dia acabamos por ter um acidente muito violento. É um troço que exige muito dos travões, em virtude de ser a descer durante muitos kms, e a verdade é que este órgão mecânico não aguentou o esforço, tendo ficado sem travagem de uma forma repentina. Com o excesso de temperatura o óleo acabou por sair das pinças de travão e, nessa altura, fiquei completamente sem hipótese de evitar a saída de estrada.

16. Os acidentes nas suas provas… Faz deles um drama? Como os encara?
Bruno Magalhães: Não faço um drama e felizmente têm sido muito poucos, já que a última vez que tinha desistido por acidente havia sido em 2003. Temos de encarar isso com naturalidade, o desporto automóvel é assim.

17. Já há muito tempo que a vitória o escapa na Madeira. Para quando essa conquista?
Bruno Magalhães: Como disse não tenho sido nada feliz neste Rally, mas acredito que um dia vou vencer esta prova, pois sabemos que é uma prova onde andamos sempre muito depressa, por isso espero que seja para o próximo ano.

18. De que maneira o rally português pode atrair a atenção dos portugueses e dos media?
Bruno Magalhães: Eu penso que atraí os espectadores, basta que haja um bom espectáculo. As provas mais importantes têm sempre muitos adeptos, o que naturalmente chama os Media. Claro que penso que a atenção de que somos alvo não é suficiente pois o nosso país vive demasiado para o futebol.

19. O rally é um mundo competitivo tal como os desportos em geral. Como se lida com essa competição? É uma competição saudável?
Bruno Magalhães: Nos rallys é mais saudável do que em outras disciplinas automobilísticas pois não existe confronto directo em pista. Cada um vai no seu minuto e faz o seu melhor, não existem situações de acidentes entre pilotos pelo que a convivência é mais saudável. Eu lido muito bem com isso, embora hajam pilotos que a partir do momento que competem directamente com outros não conseguem conviver da mesma maneira que anteriormente.

20. Enquanto piloto, como se mantêm motivado?
Bruno Magalhães: É muito fácil, basta fazer o que mais se gosta.

21. Objectivos para o futuro?
Bruno Magalhães: Continuar no IRC em 2011 para aproveitar a aprendizagem deste ano.



28.10.2010

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Conversa com... Rita Latas

“Muitos dizem que é uma parvoíce as pessoas correrem atrás de uma bola. Para mim, é uma paixão.”

Rita Latas, começou a jogar futebol aos 11 anos e diz só tencionar “parar quando as pernas não o permitirem mais”. É universal na sua equipa de futsal e joga a médio no futebol de 11. Este desporto é mesmo um “amor incondicional na minha vida e representar o meu país é o meu grande objectivo. O céu é o limite”, concluí.

1. Nasceu em Sintra em 1993, desde os 11 anos que joga futebol. Como se deu o primeiro contacto entre si e o futebol?
Rita Latas: Desde sempre que quis jogar futebol mas as oportunidades no Distrito onde vivo eram poucas. Comecei por jogar na Escola Primária com os amigos e depois, através do pai de um amigo meu (ao qual devo muito até hoje), aos 11 anos ingressei nas escolinhas do Clube Lusitano Ginásio Clube onde permaneci até aos 13 anos, tendo jogado dois anos em campeonato masculino.

2. Como referiu anteriormente começo a jogar integrada numa equipa masculina. Com apenas 13 anos viu-se obrigada a desistir. Foi nessa altura que começou no futsal no Juventude. É ainda o clube que representa?
Rita Latas: Foi uma situação um pouco complicada para mim visto que sempre preferi futebol a futsal. Há muitas raparigas no nosso país que estão ou já estiveram na mesma situação que eu, pois quando estão integradas numa equipa masculina, aos 13 anos são obrigadas a deixar de jogar com rapazes por imposição das leis da UEFA. Sendo assim, e como não existe futebol feminino em Évora, foi nessa altura que deixei o futebol e me iniciei no futsal do Juventude Sport Clube onde continuo.

3. O que significa para si vestir essa camisola?
Rita Latas: O Juventude é um clube ao qual devo muito porque foi onde cresci como atleta e ser humano. Já ganhei alguns títulos com esta camisola e, mais importante, tenho um ambiente bom na equipa, tanto a nível das jogadoras como a nível do treinador Luís Papança que nos tem ajudado a crescer todos os anos cada vez mais. Foi também como jogadora do Juventude que fui primeiro observada pelo seleccionador do distrito de Évora e integrei os trabalhos da selecção distrital de futsal sub-19 e a selecção distrital de fut7 sub-17 e posteriormente pude ser observada por outras entidades nos torneios inter-associações.

4. Sente-se realizada no futsal?
Rita Latas: Sinto-me realizada no Juventude pois somos bi campeãs distritais, bi vencedoras da taça de Évora e já participamos duas vezes na Taça Nacional. No entanto, os apoios ao futsal feminino são ainda poucos. Mas a verdade é que a AFE (Associação de Futebol de Évora) tem feito um grande trabalho e um enorme esforço ao dinamizar e fazer crescer o futsal feminino no Distrito.

5. Há quem a caracteriza como um “caso sério de técnica e também de popularidade”. Como encara este elogio?
Rita Latas:O meu objectivo é melhorar o meu desempenho para contribuir cada vez mais para a equipa. É sempre bom ler ou ouvir esse tipo de elogios mas temos de assentar os pés na terra e saber ouvir tanto os elogios como as críticas.

6. Entre os dia 26 a 30 de Julho foi seleccionada por Mónica Jorge para um estágio de observação da selecção de Futebol 11 Sub/19 em Rio Maior. Como foi sentida por si essa chamada?
Rita Latas: Quando soube da chamada à selecção fiquei eufórica. Foi uma sensação única e vivida com muita felicidade, pois foi a consequência de que o nosso trabalho e o nosso empenho ao longo dos anos são reconhecidos, mais cedo ou mais tarde. Já o ansiava há muito tempo portanto foi um dos dias mais felizes que tive até hoje.

7. Pode-se mesmo dizer: “Rita Latas foi a jogadora do ano de Futsal e foi à selecção”?
Rita Latas: No final da época (2009/2010), na Gala de Futebol da AFE, pela primeira vez foi criado um prémio para a melhor jogadora de futsal feminino do distrito. Eu era uma das jogadoras nomeadas e ganhei… fiquei bastante feliz e teve muito significado, provando mais uma vez que há pessoas que reconhecem o nosso trabalho, empenho e dedicação. Logo a seguir fui chamada à selecção por isso foi uma época de grandes conquistas para mim.

8. Essa é uma experiência para nunca esquecer?
Rita Latas: Sem dúvida. Foram três semanas recheadas de momentos muito bons que partilhei com pessoas espectaculares que tive oportunidade de conhecer. Esta experiência permitiu-me aprender muito mais sobre a dificuldade do futebol ser jogado de maneira fluída, até porque como venho do futsal ainda não possuía a dinâmica que me permitisse jogar de forma plena. Ao longo dos treinos fui-me habituando e as coisas começaram a sair de forma mais natural. Foi uma experiência única que espero poder repetir.

9. Como é o ambiente vivido no seio da selecção feminina?
Rita Latas: É um bom ambiente. Temos de saber distinguir os momentos em que temos de trabalhar a sério dos momentos em que nos podemos divertir. E penso que nestes três estágios onde estive soubemos fazer essa distinção e criar um bom ambiente onde não houve complicações.

10. Sente que entre mulheres, a competição chega a ser maior que no mundo masculino?
Rita Latas: Numa selecção, tanto de homens como de mulheres, é óbvio que todo o trabalho é encarado de forma mais séria pois estamos com a vontade e responsabilidade de poder representar o nosso país em altas competições. Sinceramente, não me parece que haja uma grande diferença entre a competição vivida no seio masculino e a competição vivida no seio feminino. Naturalmente, todas estávamos nos estágios a lutar por um lugar na selecção mas, apesar de sabermos isso, o grupo manteve sempre uma postura positiva e unida. Falando por mim, fui vivendo cada dia do estágio de forma tranquila, tentando mostrar o meu futebol e crescer a cada treino. Infelizmente, não consegui ficar na selecção que vai participar no apuramento para o campeonato da Europa mas acredito que se algo nos tiver realmente destinado, vai acontecer, seja daqui a um mês ou daqui a um ano. Quero colocar em prática tudo o que tive oportunidade de aprender para crescer mais e espero que no futuro esteja melhor preparada para enfrentar o desafio da selecção.

11. E como caracteriza a Seleccionadora, Mónica Jorge?
Rita Latas: Gostei muito de trabalhar com a professora Mónica pois é uma pessoa exigente, com objectivos bem definidos e persistente, lutando todos os dias para dignificar o futebol feminino e para que esta modalidade possa ocupar o lugar merecido no desporto em Portugal.

12. Vê essa como uma oportunidade que em tempos pensou que não a conseguiria?
Rita Latas: Todos nós temos dias em que só nos apetece desistir, e eu não sou excepção. Já tive dias em que duvidei de todas as minhas capacidades e em que pensei que nunca conseguiria chegar à selecção. No entanto, tentei sempre focar-me no meu objectivo e continuei a acreditar que, um dia, eu estaria com as quinas ao peito.

13. Sempre temeu que as oportunidades podiam ser mais escassas, visto este ser um mundo composto mais por rapazes?
Rita Latas: Claro que sim. Tive sempre bem presente que a escalada não ia ser fácil, até porque na altura em que comecei a jogar futebol, as raparigas não eram bem vistas no futebol pelos rapazes. Mas fui conseguindo afirmar-me na equipa masculina e as oportunidades foram surgindo, mantendo ainda hoje boas amizades com os rapazes que foram da minha equipa e que me continuam a apoiar. Devo dizer que é muito importante sentir este apoio.

14. Para si como é ainda vista a mulher dentro das quatro linhas?
Rita Latas: A mulher continua a ser olhada no mundo do futebol com algum desagrado e como alguém que não sabe jogar futebol, sofrendo assim de alguma discriminação (se bem que a mentalidade das pessoas está a mudar). Felizmente, temos alguns exemplos femininos a nível mundial que conseguem contrariar essa ideia mostrando o seu valor enquanto atletas de futebol. Outro ponto que também é importante referir está relacionado com a imagem das jogadoras. Ao contrário do que toda a gente pensa e diz, o futebol feminino não é jogado por “Maria-rapazes”, mas sim por raparigas que gostam de futebol, e muitas delas bastante femininas. A pouco e pouco, penso que as pessoas vão começar a aperceber-se disso e as mentalidades vão mudar gradualmente.

15. Ainda há mentalidades retrógradas que a assustam?
Rita Latas: As mentalidades retrógradas vão existir sempre, seja em maioria ou em minoria. Mas como já disse, está a ser feito um trabalho para que essas mentalidades evoluam de modo a que as jogadoras não se sintam tão discriminadas.

16. E o mediatismo à sua volta… Com certeza a selecção trouxe-o… Como lida com ele?
Rita Latas: A ida à selecção não me trouxe um grande mediatismo até porque não foi um assunto do qual eu tivesse falado muito. Recebi mensagens de apoio de amigos, familiares e de pessoas que me têm acompanhado na minha evolução no futebol tais como os técnicos da AFE e da equipa que represento. As outras situações nas quais me abordaram sobre o assunto estiveram relacionadas com pessoas que viram a notícia e a minha foto no jornal distrital ou no blogue do clube, e me perguntaram se eu ia mesmo à selecção. Após os estágios, perguntavam-me como tinha corrido.

17. Representar a equipa das quinas foi algo que sempre sonhou?
Rita Latas: Representar a selecção nacional é um sonho que todas as raparigas e rapazes que jogam futebol federado em Portugal pretendem atingir e naturalmente é um objectivo que quis ver concretizado desde sempre e para o qual vou continuar a trabalhar. Não posso dizer que já o tenha atingido por completo, pois ainda não vesti a camisola de Portugal num jogo oficial. Vou continuar a desenvolver o meu trabalho com empenho para que esse dia possa chegar.

18. E a sua família como vê tudo isto que se passa à sua volta? Sempre a apoiou?
Rita Latas: Tenho muita sorte com a família que tenho porque sempre me apoiou, tanto na vida como no futebol. Quando vivo alegrias, eles vivem comigo. Quando sofro, também sofrem comigo. Os meus pais e o meu irmão acreditam tanto ou mais do que eu que conseguirei ir longe no meu sonho mas ajudam-me também a compreender que não posso viver num mundo de ilusões ao achar que posso fazer do futebol uma verdadeira profissão. Para isso, tento conjugar os estudos com o futebol e quem sabe, um dia, as coisas mudem e possa fazer do futebol a minha profissão durante alguns anos.

19. O que significa para si fazer rolar uma bola?
Rita Latas: Muitos dizem que é uma parvoíce as pessoas correrem atrás de uma bola. Para mim, é uma paixão.



Data: 19.10.2010

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Conversa com... Naide Gomes

“É quase obrigatório ganhar uma medalha, mas nem sempre é possível…”

Naide Gomes, nasceu em São Tomé mas com apenas dez anos chegou a Portugal. Não trouxe consigo na bagagem o atletismo, no entanto esta modalidade desde cedo fez parte do seu dia-a-dia. Actualmente raramente fica fora do pódio. Reconhece o seu valor e os factos falam por si. Está entre as melhores atletas do mundo no salto em comprimento.

1. É natural de São Tomé. Como chegou a Portugal?
Naide Gomes: Cheguei a Portugal com apenas 10 anos, vim ter com a minha mãe que já se encontrava a viver em Portugal. Viemos (eu e a minha mana) em busca de melhores condições de vida e de estudo. Desde 1999 que trabalho com o Prof. Abreu Matos e a sua visão motivou-me a pedir a naturalização, uma vez que teria mais oportunidades para entrar em competições de alto nível. O processo foi longo e só aos 22 anos me naturalizei portuguesa.

2. O atletismo foi um desporto que já trouxe consigo na bagagem?
Naide Gomes: Não, quando cheguei a Portugal não conhecia nada de atletismo, mas cedo o atletismo tornou-se o centro da minha vida. Iniciei o atletismo no Desporto escolar quando tinha 13 anos, por incentivo do meu professor Mota Capitão, é a ele que agradeço por ter-me aberto o coração para o atletismo.

3. Como se deu o gosto pela modalidade?
Naide Gomes: Descobri um talento inato para o atletismo aos 13 anos. Vencia todas as provas escolares e o meu professor incentivou-me a apostar nesta modalidade. Eu competia apenas por gosto e não imaginava tornar-me atleta profissional. Até que decidi dedicar-me mais a sério ao atletismo e comecei a colher os frutos do meu empenho.

4. E porque o salto em comprimento?
Naide Gomes: Comecei nas Provas Combinadas (pentatlo e heptatlo) e alcancei uma medalha de prata europeia e uma medalha de ouro mundial. Embora a minha versatilidade fosse um ponto forte, as lesões que advinham de praticar diferentes disciplinas falaram mais alto. Com a ajuda do meu treinador, percebi que tinha de especializar-me para continuar a competir e o considerámos que o salto em comprimento era a melhor aposta.

5. Passou por vários clubes, até que chegou ao emblema leonino. O que esteve na base dessa integração?
Naide Gomes: Antes de integrar a equipa do SCP estive no JOMA durante algum tempo. A minha vontade de crescer profissionalmente e o meu talento acabaram por desencadear um convite para representar o Sporting, o qual tive muito orgulho em aceitar.

6. O que significa para si pertencer ao clube de Alvalade?
Naide Gomes: Tenho uma relação muito boa com o SCP e especialmente com o meu treinador. É para mim uma honra continuar no clube que me desafiou e acolheu desde 1999.

7. Quem são os responsáveis pelo seu sucesso?
Naide Gomes: Para além da minha dedicação, empenho e força, julgo que o meu sucesso não seria possível sem o Prof. Abreu Matos, o meu treinador, a minha família, os meus amigos que tanto me incentivam e o Sporting Clube de Portugal que sempre me apoiou financeiramente para que pudesse dedicar-me exclusivamente ao atletismo.

8. Qual é o seu primeiro pensamento quando entra num estádio?
Naide Gomes: Sempre que ponho o pé numa pista deixo para trás qualquer insegurança ou nervosismo. Estou ali para dar o meu melhor e vencer.

9. Rapidamente conheceu as luzes da ribalta. Como lida com o mediatismo à sua volta? Autógrafos, fotografias…
Naide Gomes: Sinto-me muito acarinhada pelos portugueses. Oiço muitas vezes palavras de incentivo e de agradecimento, o que me deixa ainda mais motivada para superar com distinção todos os desafios que me apresentarem.

10. Já participou em muitas e variadas provas mas vamos falar numa em especial. Como caracteriza a final dos jogos olímpicos em Pequim? Um drama? Porquê?
Naide Gomes: Depois de tanto esforço, empenho e sofrimento para chegar até lá, o que aconteceu marcou-me muito. Foi difícil aceitar que estava afastada dos Jogos Olímpicos. No entanto, fiquei também mais forte e motivada psicologicamente porque sei que sou uma grande atleta e, como tal, nunca baixo os braços.

11. Alguma vez penso em desistir da competição?
Naide Gomes: Não. Mesmo quando tenho muitas dores isso nunca me passa pela cabeça. Porque a paixão por aquilo que faço é tão grande que a palavra desistir nunca fez e fará parte do meu vocabulário. Sei que nos próximos anos irei afastar-me das pistas, é o curso natural das coisas, mas não queria deixá-las sem ter uma sucessora.

12. Mais recentemente no passado dia 2 de Agosto chegou a Portugal vinda da participação nos europeus de Barcelona. Foi a melhor dos 4 portugueses, trazendo para casa a única medalha de prata. Aspirava a medalha de ouro que perdeu para a letã Radevica?
Naide Gomes: Naturalmente que quando fui aos Europeus de Barcelona, o intuito era regressar a Portugal com o ouro. Mas nem sempre é possível. Dei o meu melhor, por isso estou satisfeita.

13. Como é perder num desempate? É um sabor ainda mais amargo?
Naide Gomes: Quando estamos na alta competição temos de estar preparadas para estes dissabores.

14. Lamenta a má sorte em relação ao ouro que ficou por ganhar na competição?
Naide Gomes: É claro que o factor sorte também entra para a equação e quando ela está do nosso lado conseguimos ir um pouco mais longe. Mas o que mais me interessa é continuar a luta para me superar.

15. Há poucos dias atrás esteve em Estocolmo para tentar ganhar o diamantezinho. Tal não aconteceu…
Naide Gomes: A participação em Estocolmo não correu como gostaria, não consegui encontrar-me durante toda a competição, talvez por estar um pouco cansada e o joelho não se encontrar nas melhores condições. No entanto, já fiz mais 2 competições, que também não correram como gostaria, e não consegui conquistar o tão precioso diamante. Fiquei em 3º lugar na Diamond League… mas estou feliz com a época que fiz e que ainda não terminou…

16. Em qualquer competição, como é ver-se fora do pódio?
Naide Gomes: Não é habitual ficar fora do pódio. Reconheço o meu valor e sei que estou entre as melhores atletas do mundo no salto em comprimento. É quase obrigatório ganhar uma medalha, mas, lá está, nem sempre é possível…

17. Qual a sensação de se ganhar uma medalha?
Naide Gomes: Uma medalha é a recompensa por todo o trabalho árduo de preparação, de luta para contornar as lesões e as dores. Subir ao pódio é altamente gratificante; é um orgulho.

18. Há alturas em que sente duplo sentimento, ou seja existe alturas em que se sente feliz por receber medalhas e por outro lado por essa medalha não ser a de ouro?
Naide Gomes: Quando salto, o objectivo é vencer. Quando isso não acontece, temos de transformar o dissabor em força e motivação para continuar a treinar para uma superação constante.

19. Já contabiliza dez medalhas em poderosíssimas competições internacionais. Como se sente perante tal facto?
Naide Gomes: Sinto que valeu a pena todo o esforço e dedicação, tanto meu como o do meu treinador. Que é uma honra ter talento para estar entre as melhores do mundo e que consigo levar o nome de Portugal mais longe.

20. A medalha dos jogos olímpicos e de Mundias ao ar livre, são essas as que mais aguarda?
Naide Gomes: Sim, faltam essas duas. Vou continuar a trabalhar e a lutar por elas com todas as forças que tenho e concretizar o nosso sonho (meu e do meu treinador).



sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Conversa com... António Tadeia

António Tadeia é jornalista, comentador de futebol e cronista. Numa entrevista directa, sem qualquer tipo de rodeios caracterizou a sua actividade e fez um diagnostico ao futebol português da actualidade.

1.É jornalista, comentador de futebol e cronista no jornal O Jogo assim como no Diário de Notícias. O que o fez enveredar pela área da Comunicação Social?
António Tadeia: Sou jornalista em primeiro lugar, director-adjunto de “O Jogo” e comentador da RTP depois. Vim para a comunicação social porque desde cedo quis comunicar com os outros, partilhar conhecimentos e, porque não, influenciar com a minha opinião o que pensam os outros. Há algo de evangelização na tarefa.

2.Há alguma paixão pelo futebol que o fez trabalhar para um mundo entre quatro linhas?
António Tadeia: Absolutamente. Vivo a ver, a ler e a escrever sobre futebol desde que me lembro.


3. António Tadeia para além de cronista é também director-adjunto no jornal O Jogo. Exerce mais alguma actividade no jornal e fora do mesmo?

António Tadeia: É ao contrário. A minha actividade principal é a direcção da redacção de Lisboa de O Jogo. A crónica e a opinião são inerentes ao cargo. Fora do jornal, em termos profissionais, faço comentários de futebol na RTP.


4.
O que o fez tornar um cronista assíduo no jornal O Jogo?

António Tadeia: Em 2006 tomei a decisão de deixar a chefia de redacção do “Correio da Manhã”, onde estava na sequência do meu trabalho no Record e na Record Dez, para me tornar “free-lancer”. Queria escrever mais e mandar menos. Foi bom e durou até 2009, quando de O Jogo, onde estava como colunista, me convenceram a aceitar um lugar na direcção.


5. O que pretende com o seu lado critico?

António Tadeia: Todos os opinadores querem mudar a percepção do Mundo que os outros têm. Quem tem uma opinião acha que sabe o melhor caminho e tenta convencer os outros disso. E nunca fui um opinador dos que acham que está tudo bem, que se colam ao sucesso para ficarem confortáveis com toda a gente.


6. Qual a mensagem que pretende transmitir aos seus leitores?

António Tadeia: Não há UMA mensagem. Há a tentativa de ser sério, rigoroso e justo, porque disso não abdico nunca.


7.“Poeta do quotidiano, como alguém chamou ao cronista dos nossos dias, apresenta um discurso que se move entre a reportagem e a literatura, entre o oral e o literário, entre a narração impessoal dos acontecimentos e a força da imaginação. Diálogo e monólogo; diálogo com o leitor, monólogo com o sujeito da enunciação. A subjectividade percorre todo o discurso”. Sente-se um artista?

António Tadeia: Não. Caramba!


8. A crónica é uma forma de arte?

António Tadeia: A crónica pode ser literatura e, portanto, arte. Mas eu faço menos crónica e mais opinião e análise.


9. Na sua opinião qual a importância da crónica na sociedade portuguesa?

António Tadeia: Temos excelentes cronistas em todas as áreas da sociedade, mas que infelizmente não são tão lidos como deviam.


10. É algo que enriqueci o jornal, ou a revista? Porque razão?

António Tadeia: A crónica enriquece porque nos apresenta as coisas de um ponto de vista diferente, muitas vezes pessoal, mas com ligação ao geral. E quando alguém partilha connosco as suas experiências está a tornar-nos mais ricos.


11.
No blog “Voando à deriva” de João Martinho ele refere num artigo denominado “antónio tadeia, paul-céptico” que o António é “ conhecido pelo seu prolífico trabalho na área do comportamento animal e, menos um bocado, pelo trabalho como comentador de futebol”. Tem alguma explicação para tal afirmação?

António Tadeia: Não. E creio que o autor da frase também não a terá.

12.
Há quem o caracterize também como o “comentador sem vergonha”. É um comentário que o enaltece ou entristece? Porquê?

António Tadeia: Entristece-me. E só não me envergonha (sim, tenho vergonha) porque não sei quem me caracteriza assim.

13.
Em muitas análises que são feitas os comentadores perderam, tal como os árbitros, a vergonha?

António Tadeia: Sou incapaz de reconhecer a unicidade da classe dos comentadores. Há os mais envergonhados e os menos envergonhados.


14. O mundo do comentário já lhe trouxe inimigos?

António Tadeia: Aparentemente, a julgar pelo que me pergunta, parece que sim.


15.
Como se lida com olhares invejosos à nossa volta?

António Tadeia: Nunca dei por eles.


16. Há competitividade no mundo da crónica? Sente ou alguma vez já sentiu isso?

António Tadeia: Haverá certamente. Mas nunca a senti, porque a crónica nunca foi a minha actividade principal. Desde 1989 que sou jornalista de redacção.


17.
No seu olhai mais crítico, que diagnostico faz do futebol português?

António Tadeia: Os grandes problemas do futebol português são a inexistência de mercado interno e a injustiça na distribuição da receita. Os grandes recebem muito mais do que os pequenos e assim não se estimula a competitividade. Como a globalização leva a que os grandes se apetrechem cada vez mais no estrangeiro (e não nos pequenos), o dinheiro não circula. O resultado é a diminuição de qualidade da competição interna.


18. Se pudesse, que medidas tomaria para as consegui um futebol espectáculo a um nível mas elevado?

António Tadeia: Está tudo no dinheiro. Melhor distribuição da receita e responsabilização de quem manda.


19. É um crítico em torno do que se passa a sua volta?
António Tadeia: Sempre. A crítica é indispensável ao progresso.

03.09.2010